Ricardo Gomes

Com uma câmera na mão, Ricardo Gomes mergulhou, em uma noite, sozinho, na Baía de Guanabara. Ele não poderia imaginar que, ao voltar para a superfície, sua vida nunca mais seria a mesma. O diretor do filme Baía Urbana quer deixar a vida se levar. Ele fala da relação da respiração com a queima de energia dentro e fora da agua.

Citação: Gomes, Ricardo. Entrevista de história oral conduzida pelo Forman, Alexandra Joy; Di Leo, Octávio. 2018.01.24, Água!nabara: Território Urca, Instituto Urca. Urca, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Áudio

Duração: 00:04:24

Transcrição

RICARDO GOMES – A qualidade da nossa vida tá ligada com a qualidade da nossa respiração. Dentro d’água, quando a gente coloca o tanque de mergulho nas costas, eu presto muita atenção na minha respiração; acho que vicia, parece uma aula de yoga intensa, que cada respiração eu penso nela, eu sinto o ar entrando, o ar saindo, eu controlo a minha ansiedade– até porque também, se eu controlo a minha respiração, eu fico mais tempo embaixo d’água. Fui mergulhar esse final de semana com um grupo nas Ilhas Cagarras, o pessoal voltava já quase sem ar, eu voltava com o meu tanque pela metade. Eu aprendi a controlar muito a minha respiração embaixo d’água, eu quero entender melhor isso pra trazer isso pra fora da água também, né? Esse equilíbrio entre a respiração, o pensamento, a queima de energia, o consumo energético, né? Aqui na Baía de Guanabara, quanto mais eu ficasse embaixo d’água, mais coisa eu conseguia filmar, então, eu treinava muito pra conseguir ficar quase num estado assim– como uma tartaruga que fica lá embaixo e vai– Até a cena mais legal do filme é uma cena que eu tô nadando em cima da tartaruga e parece uma daquelas câmeras da National Geographic presa no casco, mas não tava presa, tava na minha mão. Dezenas e dezenas de vezes eu me perdi aqui, porque eu ia, tipo, em cima da tartaruga, pra onde ela fosse eu ia, de noite, aí depois de dez minutos acompanhando a tartaruga, cara, eu tava num lugar que eu não sabia onde era. E eu fico tentando trazer pra minha vida, né? O deixar levar, aquele sambinha do Zeca Pagodinho, né? “Deixa a vida me levar, vida leva eu–“, quando a gente tem a coragem de entrar nessa vida e deixar essa vida levar a gente, se a gente tiver fazendo tudo certinho, a vida leva a gente pro paraíso; porque a gente vive o que a gente pensa, né? O paraíso ou o inferno não é depois que você morre, é agora. Tem gente que vive o inferno agora, hoje, nesse momento, tá vivendo um inferno em terra. Tem gente que vive o paraíso. Tem os antigos kahunas lá havaianos, eles falavam que o nosso universo material é uma projeção daquilo que a gente pensa, e o exercício de ter feito os casamentos, de ter exercitado no plano material alguma coisa física, comprar um apartamento, projetei isso numa coisa espiritual, num sonho, e hoje eu vejo que a menor conquista foi 00:03:00projetar um sonho pra Baía de Guanabara, que esse sonho já não é mais meu, que esse sonho é um sonho da população do Rio de Janeiro que de alguma maneira viu pela primeira vez toda beleza do mar; e esse sonho, muito além do meu apartamento que vai se desfazer aí em mais ou menos algumas centenas de anos, esse sonho vai ficar brilhando eternamente. Se um dia a gente veio do mar, eu já voltei pra lá, eu já sou essa centelha de luz que brilha no fundo da Baía de Guanabara. Esse lugar que a gente vai se encontrar um dia, Alexandra; eu, você, Octávio a gente vai vibrar um dia lá no fundo do mar, uma centelha de luz, de energia, vai continuar rodando nesse planeta por centenas de milhares de anos, quilômetros por segundo por todo o universo. A gente precisa da coragem de saber que a gente não é nada, pra gente poder ser tudo.

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